Para implementar um modelo muitos dados são necessários e, nem sempre, o estudo de simulação está atrelado a uma campanha de coleta de dados (infelizmente). É necessário então buscar em diferentes bases de dados tudo que você precisa para montar o seu modelo.
Para montar um modelo hidrodinâmico (acoplado ao modelo de ondas) são necessários geralmente os seguintes dados:
- Batimetria
- Vento
- Onda
- Nível do mar
- Vazões hidrológicas
- Correntes marinhas
- Temperatura e Salinidade
A seguir indico onde busco cada um destes dados.
1. Batimetria
Os dados batimétricos, como descrito no Post 3 dessa série, podem ser obtidos a partir de levantamentos batimétricos fornecidos pelo cliente ou de bases públicas de dados. Quanto as bases públicas, para simulações na plataforma continental e até mesmo em grandes rios, utilizo as Cartas Náuticas da DHN. Já para simulações de escala oceânica utilizo os dados do modelo global de topografia da NOAA, o ETOPO.
2. Vento
Para os ventos a minha base de dados medidos preferida é a do INMET (Instituto Nacional de Meteorologia). O INMET administra mais de 400 estações espalhadas pelo país e utiliza estes dados principalmente para abastecer os próprios modelos de previsão meteorológica. Na figura abaixo mostro o mapa de todas as estações e menu do sistema de filtragem onde você pode refinar a busca do dado que deseja. Para obter as séries temporais basta fazer um cadastro na plataforma que eles enviam os dados solicitados para o seu e-mail.
Mas é sempre importante baixar e avaliar os dados coletados. Confrontar com referências bibliográficas da região para verificar se eles estão de fato representando o padrão sazonal e local da sua área de interesse.
Quando faço tal análise e verifico que os dados do INMET não me atendem, utilizo dados de vento de modelos numéricos globais. A base que mais utilizo é a CFSv2 (Climate Forecast System Version 2) do Natural Centers for Environmental Prediction (NCEP). A base de dados CFSv2 possui resolução espacial máxima de 0,205° na costa brasileira e temporal de 6 horas. Além de uma infinidade de parâmetros meteorológicos, a base também disponibiliza dados oceanográficos como: salinidade, temperatura, nível médio do mar, velocidade das correntes, entre outros.
3. Onda
Para obter séries de dados longas e consistentes de ondas eu utilizo os dados gerados pelo modelo global WAVEWATCH III (WW3). O modelo disponibiliza gratuitamente os três principais parâmetros de onda (altura significativa – hs, período de pico – tp e direção de pico – dp). Os dados possuem resolução temporal de 3 horas e espacial de 0,5°.
4. Nível do mar
Os dados de nível do mar são os mais complicados de se obter já que temos poucas estações de medição ao longo da costa brasileira e os modelos globais geram apenas dados de nível MÉDIO do mar (sinal de baixa frequência).
Então, quando o estudo contratado não prevê a coleta ou fornecimento destes dados, geralmente eu sigo dois caminhos: 1°) buscar dados de nível medidos que são disponibilizados online ou 2°) construir uma série de nível astronômico/mareal a partir das constantes harmônicas locais.
Dados medidos
O IBGE mantém um conjunto de estações maregráficas espalhadas pela costa e disponibiliza todos estes dados gratuitamente em sua plataforma. Estas estações tem como objetivo monitorar a relação entre o Datum Vertical Brasileiro e os outros níveis de referência maregráfica. São 7 estações: Santana (Amapá), Belém (Pará), Fortaleza (Ceará), Salvador (Bahia), Macaé (Rio de Janeiro), Arraial do Cabo (Rio de Janeiro) e Imbituba (Santa Catarina).
Em Santa Catarina o CIRAM (Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia de Santa Catarina) possui um programa de monitoramento chamado Litoral Online em parceria com instituições públicas e privadas que integra ao todo 11 marégrafos localizados de norte ao sul da costa catarinense. Na plataforma você pode visualizar uma janela de 5 dias com o nível astronômico e o medido na estação (figura abaixo). Para obter uma série de dados medidos é preciso comprá-la (é gratuito apenas para projetos universitários ou de empresas estatais). Mas o valor é muito mais baixo em comparação aos custos de contratação de uma coleta de dados desse tipo.
Constantes harmônicas de maré
Na ausência de dados medidos de nível do mar utilizo as constantes harmônicas da FEMAR ou do modelo TPXO para para forçar meu modelo com nível astronômico/mareal.
A Fundação de Estudos do Mar (FEMAR) publicou no ano 2000 um catálogo de estações maregráficas brasileiras onde compilou e analisou dados medidos em 281 estações maregráficas registradas pela DHN. A carta de cada estação conta com diversas informações, dentre elas as principais constantes harmônicas do local. Abaixo a carta da Estação Conceição da Barra – ES, n°158.
O modelo TPXO é baseado na resolução de equações barotrópicas de maré e, para o Oceano Atlântico, produz 11 constituintes harmônicas de maré distribuídas em uma grade de resolução 0,08°, são elas: M2, S2, N2, K2, K1, 01, P1, Q1, M4, MS4 e MN4.
Obs1: Se o modelo que será utilizado não aceita como dados de entradas as próprias constantes harmônicas, basta você mesmo criar (a partir dessas constantes) uma série de nível astronômico para o período que desejar. A construção dessa série, dentre outras coisas, pode ser realizada a partir do pacote T_TIDE (versão original em Matlab e versão em Python). Caso você não tenha muita habilidade com programação, a série também pode facilmente ser construída no programa PACMARÉ (o programa é vendido em cd-rom junto com o livro “Marés. Fundamentos, Análises e Previsões” do Almirante Franco).
Obs2: para que a série de nível que você irá forçar o modelo fique o mais parecido possível com a oscilação de nível que realmente ocorreu no local, você pode somar a série de nível mareal construída a partir das constantes harmônicas a uma série de nível submareal extraída de dados medidos em região próxima. Posso explicar melhor como fazer esse processo em outro post.
5. Vazões hidrológicas
Os dados de vazão coleto sempre no Portal HidroWeb que é a ferramenta que disponibiliza todas as informações coletadas pela Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN), sendo tudo coordenado pela Agência Nacional das Águas (ANA).
Nem sempre terá disponível a série medida para o rio e período desejados. Rios muito pequenos não são contemplados na rede de monitoramento da ANA. Mas muitas vezes é possível obter tais dados de maneira indireta através de cálculos de proporcionalidade de área de bacias hidrográficas próximas ou a partir de curvas de chuva-vazão.
Porém algumas vezes é necessário rodar um modelo hidrológico para obter tais dados, sendo o mais conhecido deles o HEC-HMS.
6 e 7. Correntes marinhas, temperatura e salinidade
Unifiquei estes parâmetros já que os extraio das mesmas bases: HYCOM ou CFSv2/NCEP.
Os dados do HYCOM (Hybrid Coordinate Ocean Model) possuem resolução temporal de 3 horas, espacial horizontal de 0,08° e vertical de 40 níveis de profundidade. A minha prioridade é sempre utilizar os dados do HYCOM já que sua resolução é superior aos dados CFSv2 do NCEP (temporal de 6 horas e espacial de 0,205°). Porém, algumas vezes, a série temporal extraída no HYCOM vem falhada, com muitos dados ausentes. Quando isso acontece eu recorro aos dados CFSv2 onde nunca encontrei inconsistências.
Vale dizer que estas são as bases que eu utilizo e tenho bons resultados. E não que elas sejam as melhores e mais indicadas para o seu modelo e região. Se estiver em dúvida de qual base utilizar a melhor forma de decidir é testando, comparando resultados e buscando trabalhos que avaliam e confrontam bases específicas de dados. Existem também algumas bases de dados provenientes de sistemas de monitoramento oceanográfico nacional como GOOS-Brasil, SIMCosta, Rede Ondas, Pirata, PNBoia, Projeto REMO... entre outras. Não as citei porque nunca utilizei, então não tenho propriedade pra falar. Mas se você está em busca de dados vale a pena dar uma olhada. E se quiser me dar sugestão de boas bases de dados que você utiliza por aí, vou achar ótimo!! Para ler o próximo post da série onde falaremos do processo de calibração, clique aqui.
Gostaria de saber sobre como converter esses dados adquiridos, em arquivos aceitos pelo Delft.
Oi Regina, essa é uma dúvida que não consigo solucionar em um comentário. Mas resumidamente, tudo que você precisa é extrair uma série temporal do dado em um determinado ponto em salvá-lo em um arquivo .txt ou em uma planilha excel. Depois fica simples de inserir no Delft.